Tradução – Uma Conversa Sobre a Questão Trans

Uma Conversa Sobre a Questão Trans

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A:

Sobre o que faz uma mulher: eu digo que não é precisamente biológico – uma vez que mulheres não são todas férteis e não têm biologias idênticas – mas, obviamente, não se pode escapar desse ponto uma vez que a capacidade reprodutiva de mulheres tem sido utilizada para nos oprimir e manter várias classes opressivas.
Assim, eu remeteria ao marxismo e relembrar-me-ia que o ponto das categorias sociais não é para afirmar que todos nela estão absolutamente em uma situação idêntica, mas para compreender amplas dinâmicas sociais e como esses antagonismos e interrelações entre diferentes grupos de interesse funcionam.

O papel de vida desse grupo social, a psicologia e as necessidades são determinados por:

1. Suas socializações. – Como são ensinados a se comportar; a psicologia que é formada neles na maneira com que são tratados.
2. O grau com que o indivíduo luta contra (1), e o grau com que são auxiliados nessa luta pelo feminismo.

Mas é ainda um agrupamento socialmente formado, não alguém cuja psicologia e necessidades políticas são determinadas pela biologia.
Como isso se encaixa na teoria de “gênero”? O gênero, eu tenho notado, é simultaneamente visto como idêntico à biologia (ou o comportamento que os conservadores pensam ser causado pela biologia), e como não-biológico e um resultado do condicionamento social. E como capaz de não ter nada a ver com o condicionamento social e tratamento, mas com uma construção individual. E como uma essência inata (o que certamente sugere que existem essências inatas masculina e feminina, ou seja, masculinidade e feminilidade não são um produto da sociedade, mas da biologia).
O gênero parece ser muito flexível, mas não necessariamente útil politicamente…

B:

Concordo. Mas para expandir sobre gênero… Eu acredito que o gênero é uma hierarquia socialmente construída baseada na dominação (masculinidade) e submissão (feminilidade). Ambas são construções masculinas. Também não podem ser libertadoras.

A:

Não posso responder por B, mas como eu vejo, gênero é uma construção social e ninguém pode ter um gênero individual. Alguém pode acolher conceitos de gênero (agindo de acordo com ordens sociais e aceitando suposições baseadas em gênero sobre outros), mas, na realidade, eu penso que é nonsense dizer “meu gênero é X”.
E que droga isso significaria de qualquer maneira? Se nós estamos dizendo que isso não é idêntico ao sexo biológico (como os teóricos queer/pomo protestam, embora quando venha deles não seja muito convincente de qualquer forma), então você está dizendo que suas ações, maneirismos, psicologia, etc. são todos dessa construção social.
Então mulheres de qualquer parte do mundo, não importando quanto ou quão pouco ajam “femininamente”, não importando como elas vivem suas vidas e quais suas ocupações e interesses são, são todas consideradas como tendo o mesmo gênero enquanto que não se considerem trans.
E homens que gostam de rosa e de dançar e não se “identificam” como homens podem se considerar realmente “mulheres” (de acordo com alguns teóricos trans), apesar do fato de que em um período histórico diferente ou numa sociedade diferente, e dependendo de qual classe eles pertenciam, essas atividades podem ter sido favoravelmente consideradas dentro dos papéis de homens (de fato, em sociedades da Antiga Europa, rosa costumava ser considerado masculino).
Como eu dizia anteriormente, eu realmente penso que mulheres são um agrupamento *social*, cujos interesses, necessidades e psicologia são formados por nosso tratamento pela sociedade (sempre com os fatores de como mulheres individuais respondem a isso, é claro; e quanto o movimento de libertação das mulheres luta de volta).
A “identidade” influencia dentro disto, mas é complexa e, em alguma medida, é sobre se indivíduos, homens ou mulheres, respondem a essa situação ao tentar lutar pela libertação das mulheres, ou somente tentar trocar “gêneros”, ao fazer disso sobre qual “gênero” eles se identificam com. O que é problemático, uma vez que ambos os gêneros masculino e feminino são, como B aponta, baseados na dominação e submissão. Ainda: sendo largamente determinados pelos homens. [Ainda que eu e B diferimos, eu acho que nisso eu vejo a classe social como a base material que tem suportado essa ideologia, ainda que eu concorde que várias classes sociais têm se beneficiado do papel de desenvolver essas ideologias de “gênero” sendo efetivamente atribuídas aos homens.]
Eu digo, realmente, se as pessoas se “identificam” com mulheres como um agrupamento social subordinado, isso é ótimo. Mas isso é principalmente útil se eles utilizarem essa identificação para realmente tentar entender a opressão das mulheres e buscar compreender como a sua realidade conduz a várias táticas e estretégias, ao invés de se focar em demandar que todas nós concordemos com uma noção essencialista de gênero que vê quaisquer feministas que discordam sendo difamadas como “transfóbicas”.
Considerando que as feministas sejam as menos prováveis a se importar quando as pessoas não se vestem e agem de acordo com seu “gênero”, e são particularmente prováveis de ficarem horrorizadas com espancamentos transfóbicos e, na verdade, identificam-se com sua situação (uma vez que mulheres militantes são particularmente prováveis de atrair punições sociais por não serem complacentes o suficiente com ordens de gênero), chamar mulheres que não acreditam que o gênero seja nada mais que uma construção social de “transfóbicas” é de fato um ataque às feministas.
De qualquer maneira, somente para sublinhar a diferença entre a versão queer de “gênero” como uma construção social e o que eu vejo como uma versão materialista de como o gênero é construído:
Eu vejo-o como sendo baseado na realidade material do capitalismo e da opressão das mulheres. Isso é, “gênero” é parte da ideologia que é necessária para manter a opressão das mulheres. Qualquer opressão material sempre requer uma ideologia de suporte para convencer todos os grupos sociais, incluindo de forma relevante aquele que é oprimido, para que prossiga com isso. Então marxistas pensam que o pré-requisito material para livrar-se das ideologias sexistas é livrando-se das forças de classe que se beneficiam da opressão das mulheres. [O que não é dizer que somos tão doidas a ponto de acreditar que instantaneamente resolveria o problema, ou que o sexismo arraigado desapareceria em questão de poucos anos, o que claramente não é o caso. Mas livrar-se do capitalismo ao menos significa que você possui a habilidade para realmente combater a opressão das mulheres e a ideologia sexista sem as forças poderosas do capitalismo e um Estado que depende do sexismo combatendo de volta.]
A teoria queer tende a ver o gênero como um “pegue e escolha”. Ela certamente não parece ver os papéis de gênero socializados como decorrentes da realidade material da opressão das mulheres. Por exemplo, a psicologia das mulheres é poderosamente determinada pelas diárias, por vezes horárias, negociações de ser tratada de uma maneira sexista. Não é sobre receber sinais de rádio sobre ser “feminina”, como a teoria queer sustentaria, que de alguma forma entra em seu cérebro; e aqueles criados como garotos às vezes “pegariam” e “se identificariam com”. A psicologia das mulheres, necessidades e interesses são largamente determinados por suas experiências dessas negociações/submissões/brigas, não por mais abstratos e menos impactantes sinais de rádio/“mensagens” pelas quais elas ou qualquer outra pessoa poderia pegar.
Eu acho que é por causa dessa visão do gênero que os teóricos queer dizem que indivíduos podem ter um gênero. No entanto, é muito não-imaginativo vez que isso depende em escolher entre, ou escolher alguma combinação de, esses papéis de gênero socializados.
Então porque a teoria queer depende de pegar e escolher entre esses gêneros construídos ao invés de combater a ideologia sexista, ela aprisiona muitos dos proponentes do ativismo preferencialmente numa contradição. Eles tendem sim a serem contra a opressão homofóbica e transfóbica, mas eles tendem também a ser absortos sobre essas opressões como sendo parte da ideologia que sustenta a opressão das mulheres. Como tal, eles podem ser também um tanto sexistas e endossam a opressão das mulheres na realidade, embora eles não tenham a intenção de fazer isso absolutamente.
Finalmente, dizer que o “real gênero” de um indivíduo precisa ser reconhecido é essencializar o gênero. Pessoalmente, eu prefiro me referir às pessoas pelos seus próprios pronomes preferidos, vez que para mim isso não importa e, dessa forma, evita-se levantar uma obstrução para a discussão e a colaboração ao enfrentar-lhes com o que eles veem como um desafio imediato para alguma coisa que eles guardam afetuosamente.
Isso não significa que eu pense que exista tal coisa como um “homem de verdade” ou uma “mulher de verdade”, vez que a realidade de todos nós é socialmente determinada.
E somente mais uma observação sobre a teoria queer: ela tende a fazer parte de uma teoria interseccional que vê pessoas não-incapacitadas como oprimindo as incapacitadas, não-trans como oprimindo trans, homens como oprimindo mulheres, etc.
Então ela ignora a base material para todas as opressões que é a classe social (e, nessa instância, o capitalismo). A opressão das mulheres é vital para como o capitalismo funciona. As mulheres realizam trabalho doméstico não remunerado que alivia a pressão da demanda para promover a criação de crianças, mais assistência médica, criação da nova geração de produtores (trabalhadores), mais socialmente. Então a classe capitalista começa a manter mais de sua riqueza roubada (lucros), e o sistema movimenta-se em alguma medida nas costas das mulheres. A união da família hetero não somente “naturaliza” essa opressão das mulheres, mas ela também socializa seus novos membros em aceitar as hierarquias como normais. E a ideologia que justifica isso – o sexismo (a visão das mulheres como menos) – também ajuda a justificar a opressão das mulheres dentro da força de trabalho – menor salário, menos oportunidades de promoções, piores condições. Numerosas indústrias, como a indústria do sexo, alimentam-se da opressão das mulheres.
Então o capitalismo envolve a opressão das mulheres porque ele prospera com isso, ao invés de porque o capitalismo é simplesmente confuso e pode ser consertado. Similarmente, os capitalistas não odeiam os incapacitados, mas retêm financiamentos para ajudá-los e, assim, mais riqueza permanece no bolso de poucos.
Muito diferente da ideologia liberal/intereseccionalista que, em contrapartida, afirma que não existe qualquer base material para essas opressões, somente aqueles que não sofrem com elas estão levantando-se para oprimir aquele que sim!!
Claro, o capitalismo sim se esforça para recrutar quantas pessoas mais ele puder para prosseguir com essas formas de opressão, e isso não é somente via ideologias específicas que justificam essas opressões. É também via dar privilégio a esses outros grupos, o que os dá um interesse a mais em manter o status quo. As mais óbvias sendo a opressão das mulheres e a opressão racista. Trabalhadores brancos em países imperialistas ganham sim benefícios materiais com a super-exploração dos trabalhadores do terceiro mundo – o nosso padrão de vida realmente está em suas costas, via a riqueza roubada deles. E todo os tipos de ideologia racista (aceitação da demonização dos refúgios, aceitação de ocupações em afegãos inocentes, aceitação da despropriação de pessoas indígenas) nos ajudam a identificar-nos mais com a classe capitalista na nossa nação do que agir em solidariedade com os trabalhadores do mundo, incluindo as pessoas indígenas de nosso país.
Não acredito que eu realmente precise soletrar aqui quais privilégios os homens obtêm da opressão das mulheres que os torna propensos a continuarem com isso.

B:

Obrigada por reenergizar a discussão. Eu acho que suas perspectivas são interessantes e eu concordo com sua análise das políticas queer e inclusive muito com sua análise da opressão das mulheres e concordo que uma análise materialista é muito importante, mas, como você sabe, eu sim difiro um pouco na minha análise de classe e a opressão de classe final. Eu acredito que a opressão de classe econômica resultou do patriarcado, em oposição à outra maneira e esse fundamental controle dos homens sobre as mulheres é a opressão dominante. Mas, de qualquer forma, no que diz respeito ao “gênero”, eu acho que sua análise é precisa. Com relação a trans e “supremacia cissexista”, isso é simplesmente uma lógica distorcida – que a classe subordinada possa se tornar a classe dominante por causa de – e vice-versa baseada em – lutas identitárias internas.

A:

Eu acho – embora seja um pouco difícil de dizer – que a “supremacia cis-sexista” significa que ambos “cis-mulher” e “cis-homem” (ou seja, presumivelmente todos que não se identificam como trans) oprimem todos aqueles que sim. Mas uma vez que os requerimentos para ser trans não parecem envolvem nada em particular que não a auto-identificação, parece uma conveniente maneira para alguns declararem que todos os outros estão os oprimindo.
O que, é claro, realmente não ajuda a combater a transfobia uma vez que isso é uma coisa bem real, parte do reforço dos papéis de gênero onde alguns decidem fazer valer com violência, bullying e discriminação, diretamente contra alguém, não somente aqueles que se identificam como trans, que são percebidos como violando a heteronormatividade (o que, é claro, também inclui os papéis de gênero socializados). Mas confundir essa questão ao estar fodendo com as feministas (que é o que as alegações de “supremacia cis-sexista” geralmente parecem envolver na prática) é realmente estúpido.

B:

Transfobia é misoginia, assim como homofobia. O ódio é perpetuado rotineiramente contra as mulheres (mulheres que sim ajustam-se com a feminilidade e aquelas que não), e também homens que são percebidos como sendo feminilizados de alguma forma. É tudo sobre estar perpetuando ódio contra a classe feminina. Mas só porque alguns homens recebem o ódio misógino de outros homens não significa que eles são mulheres e não significa que eles não são criados e internalizados com privilégio de classe masculino. Homens feminilizados ainda possuem maior poder, com relação às relações de poder da classe sexual, que qualquer outra mulher.

C:

O que me incomoda sobre essa afirmação é que os escritores/ativistas por detrás disso estão indo além da demanda por inclusão em geral e pedindo que qualquer grupo que é somente de “nascidas mulheres” seja banido/bloqueado. Essa jogada anula completamente a dissidência. Sei que a maioria dos grupos de mulheres no Occupy Wall Street são trans-inclusivos, então por que não podem dois grupos dentre tantos ter um espaço para nascidas mulheres somente? Não existe qualquer paralelo entre a exclusão de trans de tais grupos e a exclusão de outros grupos sociais. A exclusão de trans não é baseada no desprezo por trans, não é baseada no ódio social, não é baseada em pensar em trans como inferiores. É baseada em argumentos que têm a ver com a história partilhada de mulheres “nascidas mulheres” como vivendo em corpos femininos e, assim, com uma história particular da sexualização desse corpo feminino. Esse não é o lugar para entrar no argumento aqui, mas para assinalar que existe um argumento que tem a ver com ideologia, história, e o que significa partilhar com outras mulheres a experiência vivida de um corpo feminino desde a infância para diante. Em outras palavras, espaços de somente mulheres são baseados em políticas examinadas baseadas no feminismo. Independentemente de você discordar das políticas ou não, é simplesmente injusto e anti-democrático clamar que as políticas desse feminismo particular sejam banidas. É claro que algumas políticas são odiosas e devem ser banidas, mas o ônus reside naqueles excludentes que primeiro dialoguem com argumentos sustentados pelo grupo que eles querem bloquear antes de clamar definitivamente pelo banimento. Quais os argumentos dos grupos de afinidade da Women Occupying Nations e da Strong Women? Vocês não acham que os leitores devem saber esses argumentos antes de assentir um banimento nesses grupos?
Sobre outra observação: se vocês alterarem a palavra “marginalização” para “opressão” ou, melhor, “exploração”, eu acredito que vocês terão uma ideia melhor do problema enfrentado pela vasta maioria de mulheres desse mundo – além de violência sexual, existe uma magnitude de trabalho não remunerado (50% do PIB do mundo). Dependendo de como você enquadra a questão, a noção de que mulheres trans são mais “marginalizadas” do que a vasta maioria de mulheres no mundo se torna absurda.
Primeiro de tudo, estou dizendo que é anti-democrático clamar pelo bloqueio de grupos de mulheres somente quando existem dois entre tantos que incluem pessoas trans, e porque esses grupos têm sólidas razões políticas para querer um espaço de somente mulheres baseado na “história” de se viver em um corpo feminino – onde você é preparada desde o primeiro dia a ser sexualmente acessível para os homens como a definição de “se tornar mulher”. É claro que pessoas trans experienciam sexualização e marginalização que é baseada, em última análise, em misoginia. Marginalização, no entanto, é um tipo de estigmatização que não é necessariamente a mesma que a exploração sistêmica por meio da qual grupos de elite obtêm mais-valia por terem acesso ao uso de corpos de grupos estigmatizados. Isso diz respeito à discriminação mas não à opressão estrutural, sistêmica. Como um grupo, mulheres trans não são de uma classe social que tem sido sistemicamente explorada – a maneira na qual as mulheres do mundo todo têm – de maneiras institucionais específicas, que começam com o processo de sexualização/socialização. A “inclusão” não é uma palavra rica o suficiente para representar os bens/objetivos políticos e necessidades a serem elaboradas em… A inclusão não é um bem em si mesma, e a exclusão não é sempre ruim – nós queremos excluir nazistas, certo? Para usar um extremo… O ponto central aqui é que precisa haver um compromisso com as reais posições políticas nos quais os extremamente raros grupos de somente mulheres querem que eles se mantenham enquanto um espaço para mulheres com uma história de viver em um corpo feminino. Por que pessoas trans não vão atrás dos enclaves dos homens com a mesma veemência que vão atrás de espaços de mulheres? Essa precisa ser uma pergunta política. Eu estou chamando para o debate antes de banir, o que seria extremamente anti-democrático.
O fato de certa pessoa trans “não se importar” mostra que não está disposta a empreender-se no debate político. A “inclusão” não é boa em si mesma, é? Mulheres trans não são as mais marginalizadas das mulheres – isso é um absurdo. O que querem dizer com marginalização? Olhe para as estatísticas da exploração das mulheres e opressão ao redor do mundo: violência doméstica, estupro, assédio sexual, trabalho não remunerado, trabalho traficado, sexualidade traficada, etc. – e a marginalização não é, na realidade, uma garantia de inclusão em qualquer espaço que qualquer grupo de indivíduos demanda inclusão em.
As motivações mudam a natureza da ação: nós excluímos nazistas por exemplo por diferentes motivações de excluir racializados ou outras mulheres que, como grupo, a propósito estão sendo excluídas realmente pela dominação masculina/branca das assembleias e pelo assédio sexual de todos os dias, etc. – como os novos grupos de mulheres estão mostrando.
Nós não podemos ter uma democracia até que nós estejamos abertas para a dissidência e o debate sobre essas questões. Ponto final.

A:

Entre tudo, existe de novo uma suposição de que “mulheres nascidas mulheres” são “cis privilegiadas” sem uma obrigação de demonstrar como isso as faz opressoras de ou obrigadas a se organizarem com mulheres trans… Bom, mulheres trans têm o privilégio de terem sido criadas como homens. E sim, independentemente se ou não alguém se identifica com ou gosta de um privilégio, isso ainda é um privilégio. Pessoas brancas possuem o privilégio de serem criadas brancas, independentemente se ou não elas se irritam com essa disposição.
E, por favor, parem com essas alegações de que espaços de “mulheres nascidas mulheres” envolvem “policiamento dos corpos das outras pessoas”. Eu tenho ouvido essa alegação histérica muitas vezes e, enquanto eu, pessoalmente, favoreço a organização feminista que inclua mulheres trans, eu tenho que dizer que feministas radicais que eu conheço abominam o policiamento de gênero e o policiamento dos corpos das pessoas. Grupos que excluem homens não são chamados por “policiamento de gênero”, assim que é entendido ser uma política sobre agrupamentos sociais, não decisões pessoais sobre gestão de corpos ou quão femininas/masculinas as pessoas são. Isso é o mesmo. Mulheres não são um grupo de gênero, nós somos um agrupamento social – nossos papéis de vida, experiências e necessidades políticas determinadas pela opressão das mulheres.
Nossa capacidade reprodutiva é aproveitada para esse fim, mas isso acontece embora algumas de nós tendo uma biologia um pouco diferente. O ponto em comum está sendo atribuído fêmea por nascimento, não nossa biologia.
Para assinalar o óbvio, espaços de mulheres nacidas mulheres – quer seja sua praia ou não – são sobre organizar-se com aquelas que cresceram sob condições opressivas similares, sendo tratadas como um membro de um agrupamento social oprimido. Elas não são sobre “gênero”. Gênero diz respeito às visões sexistas socialmente determinadas na qual os sexos deveriam/estão a se comportar e quais direitos eles deveriam ter. Os melhores grupos feministas condenam o gênero.
O acima dito está para mostrar a importância da colocação de C sobre a importância do diálogo com grupos antes de clamar pela remoção de seus direitos. Como você pode estar certo que eles não possuem uma razão para se organizar como fazem? E, como ela diz, dado que existem uma série de grupos feministas que incluem mulheres trans, por que grupos para mulheres nascidas mulheres não são permitidos se quer a um pouco de seus próprios grupos? E ainda, devem grupos socialistas ateístas ser forçados a incluir Falun Gong se eles querem manter seus privilégios democráticos? O capitalismo já remove os nossos direitos democráticos. Em se organizar contra isso, estejamos certas em mantermos nosso objtivo de um sistema social que promova às pessoas igual acesso às necessidades materiais e direitos (ou seja, Estado, economia e direitos legais), e não falhar na armadilha de pensar que podemos retificar essa situação através de reduzir ainda mais a autonomia pessoal dos oprimidos, nesse caso, o direito das mulheres em discutir, associar-se e organizar-se conforme acharmos conveniente.

D:

Não é um “privilégio” para uma pessoa com corpo de mulher que tenham acesso a banheiros somente de mulheres. (Eles são separados por SEXO, não gênero, só para lembrar) Só porque você QUER algo que um outro tenha, não quer automaticamente dizer que aquele algo é o privilégio de um outro alguém. Acessar o banheiro das mulheres não cria qualquer tipo de BENEFÍCIO estrutural ou econômico que acostuma-se a mim. Não é um privilégio. Não é também uma FORMA DE OPRESSÃO. Não podemos banalizar a REAL opressão. O tipo que tem impacto em OPORTUNIDADES DE VIDA em uma ampla escala. Devemos obter alguma perspectiva e parar de aplicar a palavra “privilégio” de maneiras que não fazem sentido.
“Mulher” é um termo nomeado para seres humanos com corpo de fêmeas pelo PATRIARCADO para diferenciar-nos dos “homens” em uma hierarquia baseada em SEXO. Mulheres são DEFINIDAS e VALORIZADAS em termos de nossa utilidade para homens DESDE A INFÂNCIA: “Aqui, menina, brinque com essa bonequinha e aprenda a ser uma boa mamãe!”. Essa acusação de “privilégio cis” não é completamente irracional, mas ela propositadamente apaga, desconsidera e minimiza a REALIDADE de ser uma fêmea-nomeada-por-nascimento. Então eu suponho que a MISOGINIA é OK nesses espaços? Eu digo, sério.

A:

Seria bom se a crítica perguntasse às feministas o que suas atividades envolvem, e realmente tentassem entendê-las, antes de fazer essas estranhas alegações pomo.
Grupos feministas de mulheres nascidas mulheres não concordam com gênero absolutamente. A última coisa que estão fazendo é “essencializando”-o. Também tendem a ser as pessoas que são mais contra a feminilidade (o que é um conceito que dizem ser imposto pelo patriarcado, ao invés de um que ocorre “naturalmente” em conjunto com a genética XX). Existe um problema maior aqui quando os grupos que estão mais em desacordo com amarrar a feminilidade às mulheres são, de forma bizarra, acusados de patrocinar esses meios da opressão das mulheres.
Certamente, a mulheres trans deve ser dada a opção de celas longe dos homens caso presas. Se não são, isso não tem nada a ver com se ou não existem um ou dois grupos de afinidades de mulheres nascidas mulheres que não as incluem. Na verdade, isso é algo bizarro de se colocar. [Eu espero que as pessoas estejam se lembrando aqui que feministas radicais têm estado entre aqueles que pressionam o Estado por políticas não-discriminatórias para pessoas trans em habitação e emprego.] Mas isso enfatiza a loucura de atacar grupos de mulheres nascidas mulheres pela sua organização autônoma quando existem sérias questões de falta de fornecimento de segurança a trans pelo Estado. Isso não vale mais a pena ser focado? Não? Prefere atacar grupos de mulheres nascidas mulheres do que o Estado?
A capacidade de chamar alguém um membro de um grupo oprimido não é um “privilégio”. Misturar associação de um grupo oprimido com não somente “privilégio”, mas também com “cis-sexismo”, “cis-supremacia” e “gênero” é, na verdade, endossar a ideologia misógina que é utilizada para oprimir as mulheres. Se estão dizendo que o “gênero” é o mesmo que a associação do grupo oprimido “mulheres”, então estão concordando com a ideologia usada para nos oprimir. Estão concordando que mulheres são naturalmente fracas, femininas, inadequadas para funções de liderança, inadequadas para as esferas “racionais”, mais adequadas a cuidar e dar.
Chamar mulheres de “cis-supremacistas” se elas não concordam com essa “criatividade” pós-moderna [regurgitação da ideologia conservadora em uma nova forma] é completamente ignorar de onde a transfobia vem. Transfobia não é preferência de organizações de mulheres nascidas mulheres devido a experiências compartilhadas daquelas no grupo de mulheres nascidas mulheres, ou ser clara sobre a diferença entre “gênero” e o grupo social oprimido de mulheres. É atacar pessoas quando elas não parecem se adaptar a expectativas de gênero. Feministas radicais são particularmente claras sobre isso assim que elas também experienciam violência e discriminação devido a não se conformar suficientemente. Porque o lugar que toda violência e discriminação devido a violar as expectativas da heteronormatividade (transfobia, homofobia, etc.) vem, é da misoginia. O ponto de todas essas ideologias é de manter apoio à opressão das mulheres, assim, nos mantemos oprimidas dentro da união da família heterossexual, escravas domésticas, e permanecemos força de trabalho barata fora disso, e os meios para os grandes lucros da indústria do sexo. É por isso que o conceito “cis-supremacia” é nonsense – porque isso emplica que todos que não são identificados “trans” oprimem aqueles que sim. Isso ignora completamente de onde a transfobia vem. E se não permitem àquelas no grupo social oprimido de mulheres, que são moldadas pelo seu tratamento crescendo e sendo ensinadas que seus relacionamentos e corpos são propriedade social, a habilidade de decidir como e com quem querem se organizar, não estão em qualquer posição de chamá-las “privilegiadas”. Estão ocupados tentando tirar ainda mais de suas escassas habilidades de fazer decisões sobre suas próprias vidas.
A homofobia e a transfobia são todas efeitos colaterais da opressão das mulheres. Mulheres nascidas mulheres experienciam elas todas. Não é uma experiência que pessoas trans descobriram, embora a tenham experienciado desproporcionalmente e isso é ultrajante, e nós precisamos nos organizar contra isso. Mas misturando o agrupamento social oprimido de mulheres com “gênero” não é uma forma de fazer isso.

C:

Isso não é a Olimpíada das Opressões, gente! Eu digo, baluartes de trans. Superem-se e parem de dar um one-up em todo mundo. É realmente imaturo e auto-centrado. Não estamos em uma competição sobre o relativo nível de “opressão” e melancolia pessoal que todos nós enfrentamos.
Primeiro, existe uma diferença experimental objetiva entre indivíduos involuntariamente atribuídos como o gênero feminino no nascimento, e aqueles que conscientemente ESCOLHEM serem tratados como “mulheres” DEPOIS de entender o que o gênero significa. Essa diferença é medida pela experiência da infância de alguém e não é uma particularmente complicada distinção de compreender. Como B tem pacientemente apontado, não precisam concordar, mas devem RESPEITAR que algumas de nós estão profundamente AFETADAS pelas nossas experiências como garotas. Quem está de fato odiando agora?
Segundo: vamos consignar o SEXO. Um artigo ilusoriamente declara que “Sexo e gênero são categorias socialmente construídas; não existe nada inerentemente macho sobre nenhum tipo de corpo”. Isso é ridículo. O “sexo” se refere à capacidade REPRODUTIVA. Se qualquer corpo que tenha um pênis destila esperma, ele é MACHO. Se um corpo possui um útero e pode ser FECUNDADO, é um corpo de fêmea. NÃO SABEM COMO OS BEBÊS SÃO FEITOS?? É um caso de órgãos reprodutivos e isso é RELEVANTE. Eu posso ser forçadamente fecundada. Homens não. É DIFERENTE. De novo, B explicou o problema: “Como um grupo, mulheres trans não são de uma classe social que tem sido sistemicamente explorada – a maneira na qual as mulheres do mundo todo têm – de maneiras institucionais específicas, que começam com o processo de sexualização/socialização.” Globalmente e historicamente, corpos femininos (e nossas crianças) têm sido literalmente PERTENCIDOS pela autoridade masculina. Isso é diferente do que pessoas trans experienciam. Parem de posicionar vocês como MAAAIS oprimidos. Só RESPEITEM a diferença.
Vocês são aqueles que estão criando a divisão e emitindo ultimatos. Não nós.

E:

Eu concordo com a C e outras que logicamente apontaram que mulheres nascidas mulheres possuem uma experiência única de enfrentar a misoginia desde seu primeiro fôlego. Isso não nega a marginalização, violência e ódio que mulheres trans enfrentam, mas dizer que são o mesmo é minimizar e destituir a experiência de mulheres nascidas mulheres. Isso sequer seria uma questão se se dissesse que as mulheres em questão eram de cor e queriam um espaço onde pudessem se reunir e partilhar suas experiências comuns livres da influência daqueles com privilégio da pele branca? Não, isso nem sequer seria um debate. Porque espaço exclusivo é às vezes necessário. Ainda existem uma série de espaços comuns onde todos podem se reunir, se juntar e apoiar uns aos outros. Não é divisivo para mulheres nascidas mulheres buscar espaço para chamar de seu, mas isso parece ameaçador por alguma razão. Talvez porque mulheres trans carregam o ímpeto de terem sido criadas como homens e, assim, sentem que ainda merecem independentemente acesso a mulheres.

A:

Perguntam-nos se não lemos nada sobre os tipos de violência sistemática que mulheres trans enfrentam. Deve estar confundindo “sistemático” com “sistêmico”. A opressão das mulheres, na verdade, ampara o capitalismo misógino. A ideologia apoiando a opressão das mulheres requer que a união familiar seja “naturalizada” e as expectativas heteronormativas, naturalizadas. Por isso, a homofobia e transfobia sendo efeitos colaterais da opressão das mulheres. Mas a opressão das lésbicas, bissexuais e homens gays e pessoas trans não sustenta o capitalismo da mesma forma que a opressão das mulheres faz. Enquanto a homofobia e a transfobia servem para o propósito de reforçar a ideologia misógina, a opressão das mulheres, no interior da união familiar, na verdade, sustenta o capitalismo estruturalmente. A escravidão doméstica das mulheres alivia os capitalistas e o Estado capitalista em fornecer serviços básicos. A união familiar heterossexual que oprime mulheres ensina os mais novos a aceitarem as hierarquias sociais e assegura que as mulheres façam a maior parte do trabalho em criar as próximas gerações de trabalhadores/consumidores.
A opressão das mulheres sustenta inúmeras indústrias, especialmente a indústria do sexo. Ela promove uma fonte de mão-de-obra barata para os capitalistas em vários campos.
Nada disso é para minimizar a violência que pessoas trans experienciam. É importante estar claro sobre o que está ocorrendo com a opressão das mulheres, todavia.
Já foi alegado que existia algo particularmente vil sobre mulheres com privilégio cisgênero não verificado como nós, alegando falar por todas as mulheres, enquanto policiamos quem é permitido alegar essa condição baseada em suposições sobre o corpo de outras pessoas e seus relacionamentos com esses corpos. Essa deve ser a coisa mais hipócrita que eu já li. O ponto da questão original era tornar grupos feministas no Occupy Wall Street sem voz se não concordassem em chamar mulheres trans “mulheres”.
Se esforçar-se para negar os direitos de um grupo oprimido de se organizar em solidariedade com outros e participar de amplas reuniões se eles não prosseguem com particulares alegações de “mulher” não é policiamento, então eu não sei o que é.
Eu espero que empenhem-se com as questões levantadas aqui sobre como a opressão das mulheres acontece, como a socialização de garotos e garotas ocorre desde a juventude e afeta profundamente, e como tentar forçar as feministas a aceitar a fusão do grupo oprimido de mulheres e o “gênero” é profundamente debilitador para a habilidade das mulheres de livremente discutir e organizar-se contra a opressão das mulheres.

E:

O que cis gênero significa?

A:

Significa que seu gênero é congruente com seu sexo de nascença. Então isso basicamente encoraja a ideia de que a masculinidade (comportamento socialmente determinado por homens) vai junto com XY e a feminilidade vai junto com o XX. Então isso coloca fora de existência aquelas mulheres não-trans que não agem de maneiras esterotipadas de gênero.
Isso é o que eu tenho visto feministas contestando – isso basicamente endossa os gêneros como natural.
Eu pego essa coisa do “esquema” e, por um momento, é por isso que eu o usava também. Simplesmente por simpatia aos sentimentos trans mas, realmente, a ideologia por trás disso é algo que não posso aceitar.

C:

“Trans” é uma categoria identitária histórica específica que é o efeito das instituições/tecnologias médicas modernas em sua reprodução da sexologia binária de gênero; uma produção de políticas identitárias baseadas na noção individualista-neoliberal que existe uma a) “identidade pessoal” e b) “atribuição de gênero” e então essa “identidade pessoal” é individual e um espaço para a livre expressão individual do gênero que pode ir contra a semente da “atribuição de gênero”. A colocação de “mulheres” de mulheres-somente, para mim, não é biológica, mas enraizada na experiência de ser marcada – e, assim, socializada – como fêmea/feminina desde o primeiro dia da infância. Não importa qual variação de fêmea alguém é, em vários tipo de classe/raça/situações culturais, um corpo feminino é marcado como sendo-sexualizado-por-homens e como vasos reprodutivos em potencial, como apropriáveis para homens em termos de cuidado emocional e uso sexual. Nenhuma butch escapa disso, por mais diferente que seja sua experiência de um corpo feminino. No entanto, uma trans feminina não tem essa experiência compartilhada da sexualização e a marcação sexual, mesmo que, como uma trans feminina, ela é agora considerada estuprável pelos homens de várias maneiras. O que eu mais contesto – ou a maior contestação – é a insistência que todos e quaisquer espaços de mulheres incluam mulheres trans. Todos e quaisquer. Isso eu acho muito suspeito. Não é suficiente ter a maior parte dos espaços até esse ponto trans-inclusivos; todo espaço que é para mulheres deve ser trans-inclusivo. Isso para mim cheira ao que Moses citou como a “apropriação final”.
Para esclarecer: eu estou criticando essa noção individualista do gênero – ou um espaço sexualmente neutro de identidade pessoal, esse espaço de escolha individual – como uma construção neoliberal: desenvolvimento do individualismo liberal em um patriarcado capitalista. É um mito ideológico que obscurece as relações sociais/de poder. Não existe qualquer “identidade pessoal” que pode ficar para trás de como o corpo é sexuado/generizado e historiciado, etc. e escolher quais desses aspectos a aceitar/rejeitar.

A:

Sobre a transfobia e os casos de violência. Isso não é o mesmo que “sofrer como mulher”, mas é assim mesmo horrível. Absolutamente horrível.
Apontamos a diferença entre analisar mulheres como uma classe social/agrupamento oprimido, e mulheres como um “gênero”. Eu não direi com qual gênero pessoas trans devem se identificar, porque isso é com eles. Mas isso não os faz parte do agrupamento social oprimido mulher, que é sobre como a sociedade trata as mulheres – oprimindo-as pelo bem do capitalismo. Pessoas são feitas mulheres por fazerem parte desse agrupamento oprimido – nossa “identidade” (ou, mais utilmente, nossas necessidades políticas) é definida por essa experiência, não por como nós nos subjetivamente nos “identificamos”. Claro, nós somos socializados a pensar que nós precisamos cumprir essas ideias socialmente impostas de masculinidade ou feminilidade de forma a ser completamente humanos. Fêmeas mulheres sentem isso tanto quanto. Então nós precisamos rejeitar essa socialização, ao invés de culpabilizar fêmeas mulheres que querem organizar-se enquanto uma classe oprimida, ao invés de basear-nos numa identificação subjetiva com essa classe oprimida.
Parte da opressão das mulheres é a de que a nós é dito que não temos o direito de parar com que os outros nos usurpem – sobre os nossos corpos, nossa sexualidade, nosso espaço individual, nossos relacionamentos. É por isso que é vital para as mulheres que, organizando-se contra nossa opressão, sejam capazes de decidir por si mesmas quais formas organizacionais isso implica.
Sendo realista aqui, a presença de alguns grupos feministas de mulheres nascidas mulheres não interrompe a organização de trans enquanto feministas com outras mulheres. Estão realçando seus sentimentos de serem ditos que estão “errados” e utilizando-os para encobrir o que está acontecendo aqui – o ultrajante bullying por não só outros grupos feministas, mas também por grupos não-feministas de forma a falsamente desenhar grupos de mulheres nascidas mulheres como tão fanáticos que devem ser excluídos dos fóruns de tomada de decisão do Occupy Wall Street. Isso é incrivelmente anti-mulher.
E, embora os autores dessa afirmação parecem se esquecer disso, essa jogada atravessa a alegação de que “é essencial que apoiemos a auto-determinação de todas as pessoas oprimidas pelas atribuições de gênero coercitivas e não-consensuais”.
Bom, o maior grupo pelo qual isso se aplica são as mulheres! Mas essa ameaça de bloquear mulheres que preferem se organizar com outras que experienciam o mesmo tipo de opressão estrututal é uma tentativa ultrajante de impedir a sua auto-determinação!
Concordo que devemos ser bem cuidadosos sobre como tentamos cooptar os outros. Ainda, não parece ser uma posição monolítica entre transexuais (pós-operados) que sua própria cirurgia foi uma “emergência”. Colocando isso de lado, eu tendo a tomar a posição de que tal cirurgia não deve ser completamente banida (para aqueles em idade suficiente para consentir), nem ficar livre de críticas. Apesar disso parecer um comentário óbvio, vez que a maioria das feministas radicais também parecem tomar essa posição. E uma vez que é uma grande cirurgia de mudança de vida, é certamente a única resposta possível entre pessoas pensantes.
Eu acho que um problema nesses fios de discussão é que discutimos uma série de posições relacionadas. Estão levantando se pode haver uma base biológica para o gênero identificado de (uma proporção não identificada de) pessoas trans. Isso também enlaça debates sobre se o transgenerismo é todo um movimento político, ou se existe uma base biológica para isso. Certamente, discussões de estudos biológicos são relevantes para essas perguntas, embora fora dos concretos sobre quais estudos e suas conclusões, nós não podemos ir mais longe com isso aqui.
Mas a discussão primária que algumas de nós estamos tendo é a questão de mulheres como não sendo uma categoria auto-identificada, mas uma social. Eu acredito que isso é parecido com o ponto de que, na verdade, não existem quaisquer raças humanas biológicas. Raças existem, mas são, na verdade, categorias sociais de pessoas que têm partilhado interesses políticos com base na forma em que são socialmente tratados.
Similarmente, mulheres são uma categoria social cujas habilidades reprodutivas são exploradas para oprimir-nos em benefício das elites das sociedades, e o fato de não termos idênticas habilidades reprodutivas não altera nossos interesses comuns. Assim, se nós formos negar a existência de categorias socialmente oprimidas com base em diferenças entre essas categorias, nós nunca poderíamos dizer que tais categorias existem. Mas o ponto da análise social certamente não é analisar aonde cada indivíduo se encaixa em cada categoria social, mas analisar amplas dinâmicas sociais.
E até mulheres inférteis tendem a ser tratadas como mulheres – mantidas na mesma classe social/agrupamento oprimido, e certamente criadas como mulheres crescendo. E ainda mais prováveis de serem tratadas como mulheres na vida adulta do que a maioria daqueles que não foram criados como mulheres.
Então eu não acho que leves variações na biologia ou na capacidade reprodutiva devem ser usadas aqui para cegar-nos nas básicas dinâmicas sociais da opressão das mulheres ou experiência compartilhada.
E eu digo isso como alguém que, no passado, concordou em envolver mulheres trans em organizações exclusivamente de mulheres. Mas, sim, eu não acho que isso seja a razão para basicamente aderir à visão burguesa que as categorias sociais oprimidas são, na verdade, sobre diferenças ou semelhanças biológicas.

C:

A, muito boa sua distinção entre auto-identificado e social. Eu somente discordaria com a colocação de que a exploração da capacidade reprodutiva das mulheres é a base para a categorização patriarcal das mulheres. Veja aquele artigo da Guillaumin. Eu concordo com ela que a exploração é mais ampla – ou seja, é a apropriação dos corpos das mulheres, e a reprodução cai dentro disso. Mas isso não tira nada do seu ótimo argumento.

A:

Concordo com muitas das colocações que a Guillaumin está fazendo – meu partido político sempre tomou a posição de que, sob o capitalismo, a opressão das mulheres dentro da união familiar é vital para sustentar o capitalismo que envolve a criação da nova geração de trabalhadores/consumidores (obviamente relacionados), outras tarefas domésticas (o que mesmo em sociedades anteriores ao surgimento das classes costumava ser realizado por grupos mais amplos de parentesco, ao invés das mulheres na união familiar hetero), mão-de-obra barata e, como a base para numerosas indústrias, particularmente a indústria do sexo (claro que os exemplos da Guillaumin de inúmeros tipos de apropriação são muito úteis).
Mas eu também devo me questionar porque mulheres são oprimidas dessa forma, assim que não poderiam os homens, como um agrupamento social, também jogar nesses papéis? Então por isso eu disse que acredito que a capacidade reprodutiva das mulheres é usada para oprimir e explorar-nos; eu não tinha a intenção de reduzir a questão a isso e, embora eu acredite que foi uma motivação mais primária em estabelecer as sociedades patriarcais (usando o conceito na histórica compreensão antropológica aqui), eu concordo que, sob o capitalismo, isso é mais complexo.
De qualquer forma, eu achei o ensaio muito interessante e gostaria de lê-lo de uma maneira mais considerada (devo admitir que eu somente o li superficialmente até agora), assim que parece que é menos diferente da análise feminista marxista do que eu achei em algumas análises do feminismo radical. Eu notei alguma diferenciação entre as análises marxistas e feministas radicais com a anterior aparentando a localizar a opressão das mulheres como sendo centrada na – no entanto, obviamente, não limitado a – união familiar hetero, e a última, aparentando colocá-la como sendo mais sobre o sexo hetero.